NÃO
HÁ PRESCRIÇÃO PARA AÇÕES DE DANOS A DIREITOS DA PERSONALIDADE!
Responsabilidade
Civil | Publicação em 16.07.13.
A
3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro
condenou, na semana passada, a empresa paulista Syntex Participações
Ltda. - comércio atacadista de produtos farmacêuticos - a indenizar
uma mulher - 48 anos de idade atual - que nasceu com os braços
encurtados porque sua mãe, durante a gestação, tomou o remédio
Survector.
A
ingestão do medicamento pela mãe causou, no feto, a focomelia,que é
uma síndrome caracterizada pelo encurtamento dos membros junto ao
tronco do bebê em formação e também pela deformação de alguns
órgãos internos.
O
juiz de primeira instância havia negado o pleito, aplicando a
prescrição, ante a demora (o ingresso da ação ocorreu só 44
anos, após o nascimento) da autora, para processar o fabricante. A
demanda judicial começou somente em 2009; a criança nascera em
1965.
Num longo acórdão (vale a pena ler!) o desembargador
Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho sustentou "o
caráter imprescritível das pretensões indenizatórias decorrentes
dos danos a direitos da personalidade"
. O desembargador, que já foi presidente da Associação dos
Magistrados Brasileiros, é considerado uma das lideranças na
Justiça Estadual do Rio de Janeiro.
Seu
julgado leciona que "como
a lide se funda em lesão à integridade física, o direito é
imprescritível, sendo possível tutelá-lo em sua integralidade a
qualquer tempo, sob pena de subtrair qualquer densidade à especial
proteção que o sistema jurídico lhe dá".
A
vítima do Survector vai receber R$ 150 mil de indenização e dois
salários mínimos de pensão mensal, até completar 70 anos, em
2035. O TJ do Rio já indeferiu uma medida cautelar da Syntex, que
pretendia ver atribuído efeito suspensivo ao recurso especial que
vai interpor. (Proc. Nº 0040604-44.2009.8.19.0014).
Precedente
gaúcho
A
5ª Câmara Cível do TJRS já havia condenado, em junho de 2009, a
Servier do Brasil Ltda. - na época fabricante do medicamento em
nosso País - a pagar reparação de R$ 40 mil por danos morais, além
das despesas médicas, a paciente que usou o medicamento Survector.
Após a utilização do remédio - produzido pelo laboratório para
tratamento de depressão - o consumidor apresentou quadro de
dependência.
Em
agosto de 2008 , o STJ - em caso semelhante - concedera indenização
de R$ 100 mil a um professor usuário do mesmo medicamento Survector.
Na época do consumo, a bula indicava como efeito pretendido "melhora
de memória",
mas, com o passar do tempo, a empresa a modificou para o tratamento
antidepressivo sem avisar devidamente a população.
Na
ação decidida pela Justiça gaúcha, o doente relatou que passou a
medicar-se com o remédio a partir de 1993, quando tinha 27 anos de
idade. Na época, o fármaco era vendido sem a apresentação de
tarja de segurança indicativa de que provocava dependência. Ao
utilizar o medicamento sem as advertências, o consumidor precisou
ser submetido a diversas internações.
Detalhe
original é que, em junho de 1998, o consumidor foi demitido do
emprego por baixa produção em face da dependência adquirida: a
filial porto alegrense do próprio laboratório, fabricante da droga,
foi quem demitiu o usuário - que era seu trabalhador.
O
relator do caso foi o desembargador Leo Lima, para quem "a
responsabilidade do laboratório é objetiva e independe de culpa,
estando condicionada simplesmente à prova de que o produto colocado
no mercado era defeituoso e que causou dano ao consumidor".
Entre 1989 e 1995, o Survector foi comercializado livremente,
sem maiores cautelas e sem retenção de receita. O Servier é o
primeiro grupo farmacêutico francês independente e segundo maior
grupo farmacêutico francês no mundo. Presente em 140 países, conta
com mais de 20.000 empregados. (Proc. TJRS nº 70028742997).
O
que é o Survector
O
Survector - ainda à venda em alguns países, mas proibido, entre
outros, no Brasil e nos EUA - é o nome comercial da amineptina, um
antidepressivo tricíclico. A principal ação do produto é a
inibição da recaptação da dopamina.
O
seu efeito antidepressivo não é bem entendido uma vez que as
medicações que atuam sobre a dopamina são em sua maioria
antipsicóticos.
A
amineptina tem um efeito de leve estimulação, assemelhando em
experimentos com ratos ao efeito da anfetamina, pois neles apresenta
dependência cruzada. A amineptina é um agonista dopaminérgico
indireto que, quando administrada prolongadamente, induz a uma
diminuição dos receptores dopaminérgicos e adrenérgicos dos
subtipos beta e alfa2. Estas modificações podem ser relevantes para
a atividade antidepressiva da amineptina.
Abaixo
a íntegra do acórdão do TJ-RJ, declarando imprescritível o
direito.